quarta-feira, maio 31, 2006

não poema obsessivo aos não poetas obcecados

Raios vos partam a vocês, poetas obcecados.
Como se a vida se resumisse a luares e orvalhos e a sofrimentos amorosos.
Ide cantar outras coisas:

Persianas estragadas de tantas rotações terrestres;
Falai da morte dos álbuns fotográficos para a ressurreição em CD dos trezentos com títulos a verde-garrafa em tosca caligrafia.
Cantai golos de calcanhar impossíveis de concretizar.
Gritai batalhas da playstation entre virtuais arqui-rivais.

Escapai do meio da merda da vossa literatura híbrida e
ide descobrir a que cheiram os corpos.
Chegai a vias de facto com o crepúsculo.
Pois podeis partir os óculos de massa e queimar os cachecóis e as boinas.
Não tenhais medo de não ver nada
e apanhai muito frio. Frio sem orvalhos!
É verão porra, apanhem sol.
E se não querem apanhar sol, trabalhem.
Aclamai o trabalho ou o anti trabalho ou o anti anti trabalho.
Largai as visões dos horizontes destruindo sonhos ansiosos de metas.
Apagai, no Fim, as falácias dos vossos versos.

Desdobrai planfletos sobre promoções do amor cliché.
Esqueçai o vosso medo e a vossa pequenez fazendo partituras com a nossa grandeza.
Caminhai por onde nós caminhamos, parando para contar cruzamentos.
Dançai noite fora sem olhar pá merda da lua, sem olhar pá merda da dança, sem ouvir a merda da música.
Dançai até ao esgotamento e em esgares sem plenitudes.
Apenas esgares, foda-se!


Parai de chamar as musas, sempre essa porra das musas!
Mijai para cima do bucolismo, do lirismo e do estoicismo.
Regai também, aproveitando, a merda do orvalho.
Crucificai a preocupação com Deus e
colocai na guilhotina todas as vossas porras de musas.
Enforcai inspirações e assombrações.


Podeis continuar obcecados com a vossa impenetrabilidade à magia do ser feminino
mas por favor
cagai nas infinitudes,
nos desassossegos
e na merda dos orvalhos.
Sempre a merda dos orvalhos.

Falai de nós, porra.
Falem de mim.

G.F.

terça-feira, maio 30, 2006

Your're ugly.

José Afonso, Fausto, Sérgio Godinho, Jorge Palma, Clã, Ornatos Violeta. Só para citar alguns, os mais conhecidos, de entre muitos génios que vão desde a autores de fados, a compositores de bandas contemporâneas, ou mesmo a gente de um novo hip hop de qualidade ou a reedificadores da antiga música tradicional lusa. Todos em comum o compor em português de Portugal. Com canções extraordinárias que sempre foram as com que mais me identifiquei. Versos densos numa língua profunda que dificilmente se torna melódica como é o italiano o francês ou mesmo o inglês a que tanto rito foi o nosso ouvido habituado. O português do Brasil é também, em excelentes casos, composto com uma qualidade invejável, com canções que ultrapassam em imaginação, jogo de palavras e doçura muito dos projectos que se vão fazendo por cá. Porém, embora com toda a sua musicalidade e ritmo, os autores brasileiros não falam de nós. Terão muito de nós sim, mas nós estamos muito mais no que diz o Palma ou o Zeca ou o Godinho. E o que venho dizer aqui tem pouco ou nada a ver com o discurso sobre as quotas de música portuguesa nas rádios. Acho que cada rádio deve ter a liberdade de transmitir o que se quer ouvir. O problema está nesse querer ouvir. Nessa falta de educação para o que é português de qualidade, não só em termos de música como também em termos de cinema, literatura. Falta-nos a exigência da excelência do que vem de dentro. Mas mais grave do que isso, falta-nos perceber o lixo que vem de fora. Não quero fazer (fazendo) um extenso texto sobre a minha opinião e entrar em generalizações. Eu gosto de música pimba, sei muitas letras de cor. Gosto de pimba, pop, europop, hip hop americano rasco, fado vadio, ou ondachoc. Porque esse populismo e o apelar ao que é fácil de ser percebido também é humanidade, também é veículo de escape à solidão ou motor de festas e ramboiadas sem quaisquer preocupações intelectuais. Enquanto a educação dominante estiver neste nível medíocre acho importantíssimo, sem ironia, existirem cantores como por exemplo Mónica Sintra a falarem de problemas conjugais que todos os portugueses passam. É claro que acho triste o público nacional não dar valor ao que de bom se faz por cá, não serem comprados mais álbuns, não ser mais incentivado pelas produtoras a existência de cantautores em português com qualidade. Porém, acho ainda mais triste, o pedantismo e arrogância de muita gente que fala mal dos Anjos ou se tenta situar em patamares superiores a Emanueis e depois é capaz de comprar álbuns (fazendo enriquecer a indústria estrangeira) ou de pedir na rádio canções como as de um senhor que escreve o que em seguida exponho. Depois disso só gostava de pedir a estas gentes que se informassem sobre o que andam a cantar e a ouvir constantemente no metro ou na ic19 engarrafados. Dizer-lhes que dois ou três ou quatro pavilhões repletos pelo Tony Carreira fazem mais pela economia nacional que a Shakira a cantar em pseudoportuguês rimas feitas com dicionários de sinónimos. E também dizer-lhes que não tenham sequer a lata de gozar comigo por gastar 10 euros para ir ver José Cid. G.F.

«A minha vida é brilhante
O meu amor é puro
Eu vi um anjo
Disso eu tenho certeza
Ela sorriu pra mim no metro
Ela estava com outro homem
Mas eu não vou perder o sono com isso,
Porque tenho um plano.

Tu és lindaaaaa.
Tu és lindaaaaa,
Tu és linda! É verdade.
Eu vi o teu rosto num lugar cheio,
E eu não sei o que fazer,
Porque eu nunca estarei contigo :(

Sim, ela prendeu o meu olhar
Enquanto nós passamos um pelo outro
Ela pôde ver no meu rosto que eu estava
A voar alto
E eu não acho que vou vê-la de novo,
Mas nós dividimos um momento que ficará para sempre

Ès linda.
Ès linda.
És linda, é verdade.
Eu vi o teu rosto num lugar cheio,
E eu não sei o que fazer,
Porque eu nunca estarei contigo.

És linda.
És linda.
És linda, é verdade.
Um anjo deve ter sorrido,
Quando pensou que eu ficaria contigo.
Mas é tempo de encarar a verdade,
Eu nunca estarei contigo…» :(

dexasheis de Xunho, n Colixeu, bxinox dvrttt mtx, carpidiam, compame ppurpurinashhh*****.

Mal- lhe- queremos

O pessimismo português é bastante visivel. Até com as flores e na forma como as categorizamos somos algo derrotistas. Os ingleses também lhe fazem um "she loves me, she loves me not" mas chamam-lhe Marygold. Os italianos um "me vuoi bene, non me vuoi bene" fazem mas apelidam-na de Fiore d'oro ou apenas a confundem com a Margherita. Eu gostaria de perceber uma coisa muita simples: porque é que os portugueses não a nomearam de "Bem-me-quer" em vez de Malmequer?

Será que o primeiro português a descobrir a flor tinha assim tanto azar que decidiu para sempre marcar de forma cruel e para a eternidade esta bonita e vulgar espécie botânica? (Já agora quem foi a primeira pessoa no mundo sequer a utilizar as pétalas de uma flor para estudar probabilidades numa relação e quanto tempo livre não teria para dedicar-se a tão poéticos empreendimentos? E será que José Mourinho diz para cada pétala “bem me quer bem me quer bem me quer bem me quer”?)

Quem estiver interessado nesta ( mais uma) prova do fatalismo luso, ajude-me e pergunte pelo menos a 5 amigos se dizem Bem-me-quer ou Malmequer. Depois da resposta, ensinem os sujeitos experimentais a dizer sempre “Bem-me-queres” em vez de Malmequeres. Por exemplo mostrem-lhes 100 cartões com diferentes flores onde repetem aleatoriamente 10 vezes a imagem que vos publicono final desta teoria pertinente. Se responderem mal, corrijam, até atingirem um sucesso de cem por cento. Esses 5 amigos terão de fazer o mesmo a mais 5 amigos e assim sucessivamente até ao último falante da Língua Portuguesa fazer tal aprendizagem.

Esta campanha será mais bonita que a foleirada das bandeirinhas na janela! Juntos faremos mais por um Portugal positivo! Vamos ser mais alegres! Vamos acreditar que vai tudo correr bem! Vamos ser felizes! E vamos acabar com a injustiça da "Bem-me-quer", futura ex-Malmequer, que pouca sorte tem em nascer em Portugal ao estar condenada às más fortunas do amor lusitano. G.F.

(esta imagem que encontrei no google, com os pézinhos, ilustra bem todo o post e também o google)

segunda-feira, maio 29, 2006

cito um Amigo que escreveu melhor que ninguém acerca um tempo que partilhei.

Há exactamente um ano, a 29 Magio de 2005, estavamos a dar o primeiro concerto. Tenho andado a escrever sobre esse tempo, sobre a banda que tivemos, sobre a primeira vez que pisei um palco como vocalista de um grupo de rock, sobre a vontade maior de ir aos ensaios que às aulas, sobre a fraternidade que se criou entre aquelas gentes europeias. Sobre isso o Tiago, o maior guitarrista erasmus de todos os tempos, também deve ter sentido falta, quando escreveu:

«Pois... A vida que nos prometemos está sempre em desalinho com a vida que nos permitimos.

Existe uma semente de promessa de vida em cada um de nós, mas parece que a só alguns é permitido vê-la germinar.
Mais difícil ainda é quando nos é permitido viver essa promessa por um instante, para logo de seguida cairmos sem mais na realidade pesada do quotidiano. Esse que vive do adiamento ou da resmunguice, da incompletude ou da disciplinada acomodação.
Viver na nostalgia da vida que poderá vir a ser, porque já assim foi, porque trazemo-la connosco, insistindo inquieta e impaciente nos meandros da nossa alma: tal o fado dos que fizeram de Erasmus um tempo fora do tempo.» Pai Jordas

quinta-feira, maio 25, 2006

Sou um “não infeliz” e tenho saúde. Falta-me sempre viajar para me sentir completo. Queria viajar mais, mas sou novo, ainda me falta dinheiro. Já sei que amanhã poderei estar mais rico (assim o espero) mas então vai-me faltar tempo. No dia em que tiver tempo e dinheiro, terei pouca saúde. Resta esperar que seja então feliz, sem precisar de partidas. G.F.

A última grande canção de Caetano Veloso


Pesar do mundo

pesar de tudo
pesar do peso
pesar do mundo
sobre si mesmo
pesar de nuvem
pesar de chumbo
pesar de pluma
pesar do mundo
desponta estrela
no vão imenso
por ti suspenso
à tua espera

tudo se afronta
pedra com pedra
a própria onda
quando se quebra
a melodia
onde me leva
onde alivia
onde me pesa
tudo se agita
durante a queda
o que sustenta
a nossa terra?

e nesse quando
somente um ritmo
peso e balanço
um som legítimo
canção sem medo
de você pra mim
ó meu segredo
te rezo assim:
desde o princípio
ao ponto cego
eu arremesso
um eco sem fim


José Miguel Wisnik
Paulo Neves

2005

domingo, maio 14, 2006

Diálogos imaginários no céu I

Há muito que Sigmund queria encontra-lo e fazer-lhe uma pergunta. Um dia, depois do pequeno almoço cruzaram-se. Sigmund não resisitiu:

"Senhor Luther King, por acaso não tem tido mais sonhos?" G.F.

sábado, maio 13, 2006

mas não sozinhos

Então parámos tudo o que estávamos a fazer e começámos a olhar de um para o outro. Não porque houvesse muito por fazer e pouco por dizer. Apenas nos desligámos de fora. Pusemos o mundo no “off”. Ou nem sei se chegámos em algum momento a recarregar no power. Talvez tivesse sido a bateria a acabar por si própria. Estávamos ali. Nus mas não sozinhos. Sem música. Sem quadros. Dançámos e retratámo-nos. Estávamos nus e não sozinhos. Contámo-nos e éramos mais que a soma dos dois. Então quisemos esquecer as contas e resolvermos num impulso martelar todas as calculadoras que tínhamos em casa. Não sobrou nem um sinal de subtracção. Quisemo-nos multiplicar outra vez. Tirámos as teclas de todos os teclados e eu escrevi-te com elas uma canção de amor. Depois escondeste os tabus no sótão entre os livros que nunca quisemos ler e aqueles velhos colchões de molas gastas. Encontrámos uma lista telefónica de 1963 e decidimos que nome dar a um filho. Depois voltámos a virar costas ao planeta e ficámos outra vez sós. Quase no final ainda me voltaste a dizer que não te sentias sozinha. Mesmo estando nua. G.F.